Um modelo de Educação centrado na
aprendizagem
Fonte: Sales (2005)
No paradigma educacional
centrado no ensino, marcante na escola tradicional, o professor tem por função
transmitir conhecimento de forma linear, compartimentado e acabado, tendo o
aluno o papel de receptor passivo e a responsabilidade de aprender (CARRAHER,
1986).
Este modelo está
sendo substituído por um novo paradigma: o paradigma construtivista, centrado
na aprendizagem, no aluno e na construção do conhecimento.
Neste paradigma,
compreende-se aluno como um ser ativo que gerencia sua própria aprendizagem:
pensando, articulando idéias e construindo representações mentais na solução de
problemas, constituindo-se no gerador de seu próprio conhecimento.
Entretanto, a
maioria de nossas escolas ainda pratica uma abordagem tradicional. Essa
abordagem considera o aluno como um objeto numa linha de montagem, no qual o
conhecimento é depositado pronto e acabado, e sua única obrigação é
passivamente digeri-los e reproduzi-los quando solicitado.
Segundo Valente
(1999), a mudança que hoje opera na produção de bens e serviços, do paradigma
da produção em massa, ditado por alguém que empurra a produção, para o da
produção enxuta, puxada pelas necessidades do cliente, implicará em profundas
mudanças no sistema educacional.
A
educação deverá operar segundo este novo paradigma. Isso implicará em
professores melhores qualificados, não para empurrar a informação ao aluno, mas
para saber criar situações onde o aluno “puxa” a informação. O conhecimento
deverá ser fruto do processamento dessa informação [...] Isso exigirá do aluno
a compreensão do que está fazendo para saber tomar decisões, atuar e realizar
tarefas (VALENTE, 1999, p.30).
Mudança de
paradigma é algo que demanda tempo. Entretanto, é preciso agir, iniciando-se
por estabelecer diálogos com os envolvidos no processo ensino-aprendizagem que
os levem a buscar uma nova práxis pedagógica de forma a produzir
ressignificações no ser, no fazer e no compreender.
Ao moldar um novo “ser
professor” e um novo “ser aluno” deve-se colocar em prática o que propõe
Valente (1998) ao afirmar que no paradigma construtivista, a aprendizagem deve
ser a prioridade, que o controle de seu processo esteja nas mãos do aprendiz,
que por meio de seu engajamento intelectual participa do processo de construção
do conhecimento, e que o professor compreenda que educação não é só a
transmissão do conhecimento, mas sua construção pelo aluno.
Na esfera do
“novo fazer” e do “novo compreender” propõe-se a criação de ambientes de
aprendizagem que levem o aluno a realizar suas atividades e construir seu
conhecimento de forma a transformá-lo num ser criativo, crítico, que amplifique
sua capacidade de pensar, de aprender a aprender, de trabalhar em grupo, de
fazer uso de tecnologias da informação e de cada vez mais desenvolver seu
potencial cognitivo, afetivo e social, não de forma individual, mas como
sujeito coletivo.
Para Lévy (1993) o
desenvolvimento destes ambientes de aprendizagem é o resultado de uma nova ciência,
“a ecologia cognitiva” [1],
onde o ‘eu’ dá lugar à coletividade e valoriza-se a interação social e o meio
cultural: “Não sou ‘eu’ que sou inteligente, mas ‘eu’ com o grupo humano do
qual sou membro, com minha língua, com toda uma herança de métodos e tecnologias
intelectuais” (p.135). Reforçando a idéia de um ser coletivo, cita-se Freire
(1981): “Conhecer que é sempre um processo, supõe uma situação dialógica. Não
há, estritamente falando, um ‘eu penso’, mas um ‘nós pensamos’” (p. 71).
É possível que este seja o
caminho para um fazer pedagógico mais próximo do aluno que do professor, mais
próximo da aprendizagem que do ensino, mais construtivista que tradicional.
O quadro a seguir (Quadro 1), fundamentado em Carraher (1986), complementa e auxilia na compreensão dos
paradigmas tradicional e construtivista de educação que vem sendo exposto, ao
apresentar uma síntese e fazer um paralelo entre estes modelos e os elementos
envolvidos no processo educacional.
TRADICIONAL
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CONSTRUTIVISTA
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CONHECIMENTO
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-É algo pronto e organizado em
conteúdos com informações, coisas e fatos isolados.
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-É uma representação mental,
personalizada, ou seja, moldada à nossa maneira de representar, pensar e
interpretar algo.
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ENSINO
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-Dá-se pela transmissão de informações e técnicas com ênfase maior nos fatos.
-É centrado no professor.
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-Correlaciona-se a aprendizagem
(não se ensina quando ninguém aprende).
-Tem por metodologia estimular
o raciocínio, por meio da exploração e descoberta.
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APRENDIZAGEM
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-Dá-se por repetição das
informações e seu armazenamento na memória.
-Ênfase em respostas certas não
incentivando o aluno a pensar e raciocinar.
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-Dá-se pela oportunidade do ato
de pensar e raciocinar e pelas descobertas realizadas pelo aluno.
-É um processo prazeroso e
autêntico.
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PROFESSOR
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-Gerenciador da aprendizagem do
aluno e inibidor de sua capacidade intelectual, muitas vezes oferecendo
respostas prontas.
-Tem por responsabilidade ministrar
aulas, pouco se importando se o aluno aprende ou não.
-Tem antipatia para com os
erros.
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-Tem por função ajudar o aluno
a fazer descobertas e aprender.
-Seu sucesso como educador é
avaliado em termos de seu sucesso com os alunos.
-Tem prazer em discutir os
erros e as idéias intuitivas do aprendiz, tratando-as como hipóteses.
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ALUNO
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-Vai para a escola para receber
educação.
-Não faz descobertas
autênticas.
-É culpado pelo fracasso
escolar.
-Tem a responsabilidade de
aprender.
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-Descobridor de seu próprio
conhecimento.
-Tem seu próprio modo de
pensar, suas idéias são representações mentais.
-Ser ativo que utiliza sua
imaginação e bom senso para resolver problemas.
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MATERIAL DIDÁTICO
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-Limitam-se ao estilo
exclusivamente expositivo e informativo.
-Levam a uma sobrecarga na
memória do aluno.
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-Valorizam mapas mentais e
buscam a reflexão.
-Valorizam o lúdico.
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Quadro 1 – Síntese
dos Modelos Tradicional e Construtivista
Acompanhando a evolução tecnológica dos computadores e sua
aplicação ao ensino, os modelos de educação com suas teorias de aprendizagem,
tem-se passado do paradigma tradicional/instrucionista para o paradigma
construtivista/construcionista. O termo construcionismo, criado por Seymourt
Papert, é um neologismo do termo construtivismo de origens piagetiana e
relaciona-se ao fato de atividades construtivistas de aprendizagem ocorrerem a
partir do uso do computador, dando-lhe um novo sentido.
A seguir, fundamentado em Valente (1998) e Papert (1986, 1994), apresenta-se
o Quadro 2, que sintetiza os modelos instrucionista e construcionista de
educação.
INSTRUCIONISTA
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CONSTRUCIONISTA
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CONHECIMENTO
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-Adquirido por meio da
instrução.
-A única maneira de melhorar o
conhecimento do aluno sobre determinado tópico é ensinar mais sobre aquele
tópico.
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-Ênfase na construção do
conhecimento e não na instrução.
-A busca do conhecimento
específico que o aluno precisa, é que o ajudará a obter mais conhecimento.
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ENSINO
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-Dá-se no sentido:
Computador-Software-Aluno.
-Por meio do computador o aluno
é instruído e pode adquirir conceitos sobre qualquer área.
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-Dá-se no sentido:
Aluno-Software-Computador.
-Tem por objetivo ensinar de
forma a obter a maior aprendizagem com um mínimo de ensino.
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APRENDIZAGEM
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-Aprendizagem centrada no
ensino.
-O computador comanda a
aprendizagem do aluno.
-A via que conduz a uma melhor
aprendizagem é o aperfeiçoamento da instrução.
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-Centra-se na aprendizagem e
não no ensino.
-A aprendizagem ocorre em razão
do aluno estar executando uma tarefa mediada pelo computador.
-O aluno gerencia seu próprio processo
de aprendizagem.
-Visa desenvolver a capacidade
matética[1].
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PROFESSOR
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-Repassador do conhecimento e
instruções.
-Tem o papel de especialista de
conteúdos.
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-Criador de ambientes de
aprendizagem.
-Agente facilitador do processo
de desenvolvimento cognitivo do aluno.
-Mediador da interação
aluno-computador.
-Tem por função a investigação
da estrutura mental do aluno.
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ALUNO
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-Receptor passivo do
conhecimento.
-Consultor de instruções.
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-Construtor de seu próprio
conhecimento.
-Gerenciador da informação, da
solução de problemas e da aprendizagem independente.
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O USO
DO COMPUTADOR
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-Máquina de ensinar (instrução
programada).
-Informatização dos métodos de
ensino tradicionais.
-É introduzido na Escola como
disciplina curricular, é o aprender sobre computadores.
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-Ferramenta intelectual para
promover a aprendizagem.
-Meio de transferência do
controle do processo de ensino do professor para o aluno.
-Veículo auxiliar no processo
de expressão de nosso pensamento e da reflexão.
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Quadro 2 - Síntese
dos Modelos Instrucionista e Construcionista
Ao comparar modelo
tradicional (Quadro 1) e instrucionista (Quadro 2) percebe-se em relação à
CONHECIMENTO que se mantém a linha enciclopédica que valoriza o volume de
conteúdo; O ENSINO é caracterizado pela centralização e transmissão de
informações; A APRENDIZAGEM ocorre de forma mecânica com ênfase na fixação pela
repetição; O PROFESSOR caracteriza-se pela centralização do saber e o
administra ao receptor ALUNO que age como ser passivo; A utilização do
computador ou de livros reflete uma linha que prioriza a instrução e a
memorização.
Nos modelos construtivista
e construcionista, embora Valente (1998) assegure que é a presença do
computador como ferramenta que faz a diferença entre eles, não se notam
diferenças significativas ao se comparar suas características citadas no Quadro 1 e Quadro 2 em relação à: CONHECIMENTO é algo fluido que se molda ao
aluno, à sua necessidade e é colocado em seus termos; O ENSINO construtivo cede
a vez para a APRENDIZAGEM como ato de prazer e descobertas; O PROFESSOR é o
agente de mediação e motivação da aprendizagem, enquanto que o ALUNO caracteriza-se
por ser ativo no processo de apreensão e de geração do conhecimento,
tornando-se autor de sua própria aprendizagem. Entretanto, O USO DO COMPUTADOR como
ferramenta intelectual e meio auxiliar do processo ensino-aprendizagem reserva
potencialidades que vão além do MATERIAL DIDÁTICO da linha construtivista, que
na tentativa de se superar, busca trabalhar materiais reflexivos e dinâmicos.
Para adequar-se ao
paradigma construtivista/construcionista, cujo foco é o aluno, a aprendizagem e
a construção do conhecimento, propõe-se a transformação da sala de aula em um
ambiente interativo de aprendizagem, como cenário das interações sociais
necessárias ao desenvolvimento cognitivo, em que o software educativo venha a
ser o instrumento mediador destas interações e o elo entre conhecimento e
aprendizagem.
[1] A
ecologia cognitiva é o estudo das dimensões técnicas e coletivas da cognição
(LÉVY, 1993)